domingo, 13 de julho de 2008

ORKUT SEM LEI: “Meu marido colocou o perfil da minha filha sem meu consentimento"

A tradutora gaúcha Dayse Batista conta que sua filha de 9 anos só tem perfil no Orkut porque o pai dela criou, sem seu consentimento. “Se eu estiver ao seu lado, posso controlar”, conta. “Mas convenhamos: existe algum pai ou mãe que fica vigiando de perto, junto aos filhos, o tempo todo, enquanto os pequenos surfam na internet?”

Confira na íntegra a entrevista originalmente publicada pelo Repórter Social (#):

Repórter Social - Há quanto tempo você está no Orkut?
Dayse Batista - Estou no Orkut há cerca de um ano, mais ou menos. Sou tradutora e trabalho em casa, há 20 anos. Minha filha nasceu e cresceu em contato com computadores, mas a novidade do Orkut começou há alguns meses, para ela. Outra coisa: quando entrei no Orkut, considerei a "novidade" maravilhosa. Ainda o vejo como um lugar legal, onde posso reunir no meu perfil todos os meus colegas de profissão, com quem mantenho um contato real e contínuo, todos os dias. No Orkut, eu posso conhecer outros tradutores, gente que gosta de escrever (como eu), pessoas com interesses semelhantes. Entretanto, sou adulta, sei o que me convém, o que pretendo extrair do Orkut e creio que doso bem o tempo que dedico ao Orkut (quase nenhum, na verdade) e o que dedico aos meus outros interesses na vida. O Orkut pode ser bom, pode ser ruim, pode ser uma distração, pode ser um vício. Pode ser uma alienação. E pode ser um risco. Depende de quem o usa e de como o faz.

Repórter Social - Eu vi o seu post na comunidade, que o pai da sua filha criou um perfil para ela... desde quando existe esse perfil?
Dayse - Meu ex-marido colocou o perfil de minha filha sem meu conhecimento e sem meu consentimento. Comunicou-me depois e não tive o direito de dizer uma palavra sobre o que ele colocou lá, por ela, como se ela precisasse usar sua voz. Minha filha tem 9 anos, Q.I. de 163 (de gênio) e não precisaria que falassem por ela. Não moro com o pai da minha filha há 7 anos, mas ela passa de sexta a domingo à noite duas vezes por mês com ele.

Repórter Social - O que sua filha achou do orkut?
Dayse - Minha filha não dá importância para o Orkut. Partiu do pai dela a iniciativa de colocá-la ali – isso, é claro, pelos "amigos" dela, que, na verdade, são os amigos dele, não da minha filha. Ela acha "legal", mas simplesmente nunca se dá ao trabalho de entrar no Orkut, e só o faz quando o pai insiste demais. Critico também a colocação de sua carinha com um apelido criado por ele para ela, que nunca foi chamada de "Lulu" por ninguém, exceto por ele. Todos a chamam de Letícia ou "Lele". Se ele pretendesse preservar a intimidade ou privacidade da filha, poderia ter usado simplesmente "Letícia" - ou ,melhor ainda, não ter exposto minha filha numa comunidade feita por e para adultos.

Repórter Social - Em que comunidades ela está? Quanto tempo ela passa, em média, no computador?
Dayse - Ela participa de apenas uma comunidade, criada por seu pai, chamada "Eu Adoro a Lulu" (eu não costumo visitar seu perfil, porque me faz mal). Admito que, sendo radicalmente contra a exposição de crianças no Orkut, eu deveria "vigiar" o perfil da minha filha, mas me faz tão mal que prefiro não vê-lo. Já travei verdadeiras batalhas com o pai dela, mas não posso obrigá-lo a tirar o perfil de lá. Sinto-me impotente. A Letícia passa em média uma hora por dia no computador, ou nem isso, mas se limita a entrar no Cartoon Network ou outros sites infantis para jogar seus joguinhos marcados nos "Favoritos" do navegador.

Repórter Social - Você acha que tem como controlar o que sua filha vê no Orkut?
Dayse - Parcialmente. Se eu estiver ao seu lado, posso controlar – mas convenhamos: existe algum pai ou mãe que fica vigiando de perto, junto aos filhos, o tempo todo, enquanto os pequenos surfam na internet?

Repórter Social - Você sabe da existência de sites com conteúdo pornográfico e de pedofilia no Orkut? Sabendo dessas comunidades/ perfis, qual a orientação que você dá para sua filha? Você tem medo que alguma coisa possa acontecer?
Dayse - Sim, conheço muitos perfis pornográficos. Com minha indignação por ver minha filha no Orkut, amigos me enviaram links, para me mostrarem que tenho razão. Como eu já disse, minha filha não dá importância nenhuma ao Orkut e, nas poucas vezes em que entrou, limitou-se a ver os meus amigos e os amigos do pai dela que são "seus amigos" em seu perfil. Entretanto, uma criança curiosa pode ir parar em qualquer perfil, em qualquer comunidade, sem a mínima possibilidade de ser "flagrada" ou descoberta enquanto está lá (acho que não acusaria nem no histórico do navegador). Basta querer. Não tenho medo que minha filha tope com sites pornográficos pelo comportamento dela em relação ao Orkut, mas temo por todas as crianças, incluindo ela, que ficam expostas a qualquer um que tenha intenções ruins e os veja ali.

Repórter Social - Você mostrou ao pai esses perfis que viu? Mesmo assim, o perfil continua lá?
Dayse -No começo,quando comecei a "brigar" para tirá-la de lá, seu pai não via nenhum problema em sua participação. Argumentei tanto, mostrei-lhe tantos links pornográficos, que ele admitiu que existem outras opções para manter sua filha em contato com o mundo. Atualmente, o perfil dela está um pouco abandonado, mas ele não a tirou do ar. Eu tentei tirá-la, denunciei que era o perfil de uma criança (a participação de menores de 18 anos é proibida, pelas regras do Orkut), mas o administrador do Orkut não fez absolutamente nada. Tudo continua como dantes. Faz-se qualquer coisa no Orkut, e de lá não se tira nenhum perfil, a não ser por vontade própria, pelo que vejo.

Repórter Social - Qual o conselho que você daria para outros pais que, assim como você, se preocupam com o que os filhos têm acesso na net, principalmente no Orkut?
Dayse -Eu diria que uma criança não precisa do Orkut. Se os pais desejam que os filhos tenham contato com o mundo digital, ótimo - sou a favor e apóio, mas que tentem fazê-lo do modo mais seguro possível. Programas de mensagens instantâneas são uma opção, desde que os filhos acrescentem seus amiguinhos e não dêem livre acesso a estranhos. Sou contra os pais tentarem transferir seus amigos para os filhos. Acho ótimo que crianças e adolescentes mantenham-se atualizados, troquem idéias e conversem com amiguinhos, por email, telefone, Messenger, mas sempre de um modo muito consciente e sem exageros. Acredito que o primeiro dever dos pais é orientar seus filhos sempre, sobretudo, e quando os filhos estiverem conectados, saber quais são os hábitos dos filhos ao surfarem na internet. Não é preciso vigiar o tempo todo, mas um pouco de supervisão nunca é demais. E criar filtros nos programas de busca é uma das medidas mais básicas de precaução contra a exibição de materiais inapropriados. No fim, eu sei que, de um modo ou de outro, nossos filhos sempre estarão expostos à violência do mundo, na internet e nas ruas. Mas, se pelo menos tentarmos limitar esta exposição, estaremos fazendo a nossa parte. Quando forem maiores, eles poderão decidir o que lhes convém ver, com que tipo de pessoas pretendem relacionar-se, com quem querem conversar. Entretanto, não creio que crianças possam discernir o que lhes convém, por mais bem-educados e queridos que nossos filhos sejam, por mais "seguros" que pareçam e por mais que tentemos nos convencer que eles "têm a cabeça no lugar".

Repórter Social - Muitos pais fazem os perfis dos filhos, muitos até quando são bebês. O que você acha disso?
Dayse - Acho que esta é uma necessidade narcisista dos pais, não tem nada a ver com os bebês. Certos pais e mães precisam mostrar sua obra preciosa ao mundo, custe o que custar. Existem aqueles que não percebem o exagero e tentam "empurrar" seus flogs, suas páginas de Orkut, suas fotos-spam para todos, tentando fazer com que todo mundo ame seus filhos. Pais seguros não precisam que outros lhes digam o quanto seus filhos são maravilhosos. Não desta maneira. Talvez os avós morem longe, talvez as intenções sejam boas - sinceramente, creio que os pais sempre têm as melhores intenções, colocando os filhos no Orkut ou em flogs. O que ocorre é que não é preciso mostrá-los a milhares de pessoas, se a intenção é mostrá-los aos avós. Para isso existem outros meios. Criança é criança. Não é uma obra-prima, não é um "grande feito", uma "façanha" única de quem os colocou no mundo. Crianças são tão especiais que, por isso mesmo, não é preciso acelerar as coisas. Logo elas estarão no mundo de qualquer maneira - se tudo der certo, quando estiverem prontas para assimilarem o mundo, não antes disso.

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